segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Amigo do Coração


Amigo do coração,

Chove muito em Paris. Aproveito a estiagem e vou passear no Jardim de Luxemburgo onde as arvores estão cobertas de dourado e o quadro é digno de um pintor. Os pálidos raios do sol derramam-se sobre elas formando um céu cintilante de estrelas. A nostalgia bate e lembro de um frio inverno, com as arvores nuas e leves camadas de neve envolvendo as poderosas deusas do Olimpo, espalhadas por esses jardins. Tu aquecias o meu corpo e a minha alma num doce e amoroso abraço.
Foram dias maravilhosos que jamais se apagarão das minhas lembranças. Espero que Deus ainda me permita transformá-los em realidade e vivenciá-los outra vez. Quem sabe se o sonho se realizará? Enquanto tiver saúde e condições pretendo voltar sempre. esta é cidade da minha paixão. Deus protege os que amam e sonham. Tenho certeza que os meus pensamentos se transformarão em realidade e então dividiremos o nosso tempo entre o sol do meu país e a primavera do teu. Sonhar é uma dádiva divina, custa pouco e aquece o coração.
Atravesso os jardins sobre um forte vento e vou caminhando para o Café de Flore, outro ponto que marcou por demais as minhas saudades. São 17 horas e estou sentada na “vitrine” referência às mesas postas na calçada. Como de costume, peço uma borbulhante taça de champanhe e brindo em tua homenagem. Pessoas passam indiferentes à velha senhora solitária que escreve o tempo todo.
De repete surge do nada um jovem tocando clarinete e eis que envolve o ar com velhas e tradicionais canções francesas: La Vie em Rose, Hino ao Amor, Sob o Céu de Paris, etc. Lágrimas escorrem silenciosas pela minha face, mas confesso: São de total felicidade. Estou feliz e, apesar de querer muito que aqui estivesses para trocarmos confidências e rirmos da vida que não é nada fácil, continuo alimentando o sonho. A minha felicidade é maior, pois estou só comigo mesma, livre de pessoas fúteis e insensíveis. O dia de hoje nesta viagem foi dedicado exclusivamente a mim, pois egoisticamente sou a minha melhor companheira.
Agradeço ao garçom, cumprimento o jovem clarinetista e sigo pelo iluminado Boulevard. Vou jantar me despedindo de Paris no Le Procope, lugar de muito charme e glamour, um dos mais antigos restaurantes de Paris e dos meus preferidos. Claro, tu estarás comigo nos meus pensamentos e juntos iremos nos afogar no delicioso vinho Sancerre.
Caminho de volta ao hotel sob as luzes bruxuleantes dos velhos lampiões e uma fina chuva caí. Ninguém se incomoda. Poucos abrem o guarda-chuva, muito menos eu. Lembras das nossas alegres caminhadas nas noites de inverno? Chuva, frio e muito calor em nossos corpos e faces coradas pelo vinho e pela felicidade. Até breve amigo. Um dia Paris será inteiramente nossa, disso tenho certeza. Beijos e saudades de uma noite de outono. Paris, 02/11/011.

quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

Amigo do Coração






A vida sempre nos surpreende e mais uma vez estou realizando um grande sonho. Conhecer este País que tanto amo visitando suas pequenas e bucólicas cidades. Estou no sul, numa linda cidade que lembra a nossa Boa Viagem, cercada pelo mar, com muito sol e calor. Se fosse jovem estaria saltitante usando shorts e tomara que caia.

Com a minha solidão consentida e sabendo que os meus filhos e netos estão bem, me sinto uma idosa na adolescência. Pelo menos os sonhos são jovens, coloridos e reais. Estou num pequeno Hotel às margens do Canal desfrutando de uma belíssima vista. Foi para mim uma surpresa esta cidade, que além do mar está abraçada por um grande lago.

Aqui me parece um paraíso, principalmente para aqueles que já viveram muito, pois é grande o número de pessoas idosas. É lindo ver a placidez das faces enrugadas, a prata dos cabelos e pares amorosos passeando de mãos dadas pelas ensolaradas ruas.

Às margens dos canais, restaurantes especializados em frutos do mar, especialmente ostras por sinal, magníficas. Sigo num barco que leva turistas para passeios entre os canais. Muita gente à minha volta e a tua velha amiga deixando-se acariciar pela brisa do mar com os cabelos soltos ao vento, que o vento curtindo a maior liberdade.

Esta cidade, berços dos poetas, tem entre seus filhos ilustres Georges Brassens e Paul Valery, que está sendo homenageado num encontro de escritores onde acontecem conferências, recitais de poesias, filmes, movimentando todo o fim de semana. Que bom para mim!

Visitei o Museu Georges Bressens e o cemitério onde ele está enterrado, que fica bem à frente, com uma bela vista para o lago. Do outro lado temos um Museu e no alto da colina, cercado pelo mar o campo santo onde dorme Paul Valery

Aqui tudo é poesia. Até a harmonia entre os grandes e pequenos cães, que servem de companhia para homens e mulheres, velhos ou jovens. Até agora como boa observadora que sou da vida, não vi nenhuma expressão de infelicidade ou abandono nos olhares dos velhos casais. Que bom! Estou feliz por descobrir este pedaço de paraíso. Beijos e muitas saudades. As margens do mediterrâneo. 26/11/011.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Querida Graça (in memorian)




Nas galáxias onde habitas provavelmente vens acompanhando a minha trajetória por esse País que tanto amavas. O tempo passou e novamente volto sem a tua companhia o que é lamentável, pois era nossa intenção sair desbravando este território espalhando ao vento toda a nossa paixão. Infelizmente estou literalmente só, apesar de fazer parte de um grupo com mais de 30 pessoas.

Quando não temos com quem dividir emoções, nos sentimos abandonadas. Eis o que acontece comigo nesta viagem. Mas como me conheces bem, corro para o papel e derramo nele todos os meus sentimentos. Voltei ao Vale do Loire e lembro da primeira vez que estive aqui com amigos franceses por uma semana, visitando de carro suas pequenas cidades, entrando e saindo de Castelos milenares com o entusiasmo e alegria da juventude. Foi uma viagem prazerosa.

Hoje faço um caminho diferente, pois vimos da Bretanha visitando Angers, Caen, Tours, Samour e Amboise. Revendo estes belos Castelos podemos sentir a vida rica deste país num passado milenar onde reinava o luxo, a pompa e o bom gosto dos reis de França.

Estamos em Chenonceaux esta pequena jóia doada à Diana de Poitiers pelo Rei Henrique II e, questiono como deveriam sentir-se àquelas mulheres esposas, amantes, favoritas dos poderosos reis que tudo faziam para agradar-lhes? Outra história que me impressionou visitando as ruínas de um Castelo Medieval foi a de Ana da Bretanha que virou a cabeça do Rei Carlos VIII. Ah! amiga que mulheres poderosas! Que fracos são os homens de hoje, ou somos nós mulheres que perdemos a nossa força?

Assim, sigo passeando por esses lugares de sonhos, entrando e saindo de cidades pequenas e encantadoras, visitando museus, monastérios, grutas e santuários. E por falar em religião, foi o de Lourdes o que mais me tocou. Foi até hoje a única concentração religiosa de que participei onde a fé e o respeito se fazem sentir em todos os sentidos. É emocionantemente lindo.

Nunca esqueci de que me falavas sempre quando eu viajava para a França, que o visitasse. Pois não é que durante a Procissão onde fiquei praticamente só, senti junto de mim as presenças dos meus mortos queridos, inclusive a tua! Fiquei feliz, pois a emoção do momento foi dividida com pessoas que realmente me quiseram bem.

Seguindo por esse país afora, estamos em Rocamandour lugar místico e belo, apenas o tempo foi curto para aproveitarmos à beleza das pequenas ruelas que formam a cidade. É uma pena que nestas excursões eles não saibam avaliar onde está o diferente, o bucólico, o pitoresco.

Hoje chegamos a Andorra, este país pequeno e encantador montado nos Pirineus na fronteira da França com a Espanha. Passamos um dia inteiro e vamos agora para Mont Serrat, Barcelona e Nice. Saudades, muitas saudades de ti, encantada amiga do coração. Principado de Andorra, outubro de 2011.

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Para Karla e Ana Paula



Minhas filhas queridas,

Neste longo e agradável passeio de trem pela Costa Azul escrevo e penso em vocês que têm alma de artista. Ontem visitei St. Paul de Vence e pude sentir como é pouco o tempo que nós turistas temos para conhecer este belo país e suas encantadoras cidades. Daí compreender a paixão dos poetas e artísticas plásticos em deixarem suas terras e virem tentar a vida, mesmo com dificuldades. Aqui eles tem todo um manacial para servir de inspiração e por mais que a gente leia e assista filmes ou documentários, nunca se compara com o pisar o solo, tocar as paredes de pedra, sentir o cheiro do mar e das flores que revestem de beleza estas vilas e vilarejos.

No alto da colina está erguida a bela casa em que Picasso viveu rico e poderoso por muitos anos. Na efervescência dos anos loucos, artistas plásticos, poetas e escritores escreveram cada um uma história diferente de vida. Que emoção entrar no restaurante museu La Colombe d`Or e ver telas pintadas por Matisse, Gaugin, Monet e do próprio Picasso num tempo onde as dificuldades da vida eram afogadas no absinto e seus trabalhos eram usados como objeto de troca para ajudá-los na sobrevivência. Hoje, St. Paul de Vence é uma galeria de arte a céu aberto. Nas sinuosas e estreitas ruelas encontramos galerias de arte, lojas e muitas e muitas flores.

Nesta viagem concretizei um sonho há muito desejado: Visitar algumas pitorescas e históricas cidades dessa encantadora região. Para melhor conhecê-las temos que permanecer por mais tempo, pelo menos uns três dias. Se me perguntarem, não posso dizer qual a mais bonita ou a melhor. Todas tem uma beleza particular, assim como as pessoas.

Da tranquilidade das águas plácidas do mediterrâneo ao perfume acre da Provence, tudo se reveste de sonho e magia. Diante dos Castelos Medievais repletos de histórias que nos remetem há séculos e séculos nos sentimos pequenos e questionamos? Qual a tecnologia moderna que resistirá às intempéries da natureza iguais a essas fortalezas construídas de pedra? A história faz parte de um contexto e quem não tem história, não tem vida.

No fim da tarde desci a colina e fui terminar o dia no Bar do Negresco, situado na “Promende des Anglais”, hotel este que marcou uma época de glamour na “Côte d´Azur”. Sentada ante uma taça de champanhe, confesso que me senti carente da companhia de um parceiro inteligente e charmoso com quem pudesse conversar sobre as coisas boas da vida. Neste sóbrio e elegante bar um jovem dedilha ao piano músicas dos Beatles que também marcaram uma geração e que hoje ainda nos encantam. Acontece que a arte, a música e a beleza jamais envelhecerão. Estarão sempre vivas seja em qual tempo for.

Hoje os grandes salões do Hotel estão transformados em galerias de arte, abrigando os mais diferentes estilos onde se misturam passado e presente. O contraste entre o novo e o velho choca às vezes. Mas o belo é sempre belo, conforme vejam os nossos olhos.

Daqui minhas queridas filhas vou para Montpellier, encontrar com Alcina para irmos de carro ver as belezas da Provença, o que dará uma outra carta. Amo a todos vocês e sinto muitas saudades, mas neste País eu realmente sou feliz, tanto como se estivesse na minha casa. Beijos carinhosos. Nice, out/2011.

sábado, 10 de setembro de 2011

Um feliz aniversário em Paris








Não foi possível escrever nesses últimos tempos, estava muito ocupada. Deixei para dar notícias depois de, por mais uma vez, atravessar o Atlântico. Vim passar trinta dias nesta cidade que é a minha paixão. Cheguei no dia 30 janeiro e estou no Carlton Hotel, no Blv. Raspail. Paris está gelada, mas como sempre, cheia de vida. Pela primeira vez, vou passar meu aniversário longe da família e dos amigos.

Início esta longa carta no Le Grand Café, Blv. Des Capuccines, bem perto da Ópera e em vários outros lugares Por enquanto estou só e aproveito para ir ao cinema, teatro e me aquecer nos pequenos e acolhedores Bistrôs, com um bom vinho, música e deliciosos queijos.

Espero uns amigos que virão por uma semana. Ela é francesa, mora na Provença e organizou um programa especial para mim. Agora, estou nos Jardins de Luxemburgo, tendo à minha frente à Fonte dos Médici, coberta por uma fina camada de gelo. É lindo. Um cálido sol de inverno aquece apesar do frio rigoroso, alguns corajosos adeptos do “cooper”.

Crianças bem agasalhadas correm e brincam. Velhos casais de mãos dadas olham-se com ternura, mostrando que o amor não tem idade, são iguais aos jovens, cujos beijos despertam a inveja de quem os vê, começando por mim. Como são beijoqueiros esses franceses!

Os amigos chegaram. Hoje visitei o Museu Rodin onde almocei e à noite fomos a Sala Playel assistir a um concerto de um pianista argentino, com belos e nostálgicos tangos. Encerramos a noite com um jantar no La Cuppole. Ah! Querida amiga, o tempo passa muito depressa, principalmente quando estamos felizes.

Hoje é o dia do meu aniversário e cumpri um intenso programa. Conheci o Parc de la Villette, nos arredores de Paris. Que lugar fantástico! Ainda falta muita coisa para terminar, mas voltei à infância na fantástica sala de cinema do La Géode. Nunca me diverti tanto, nem lembro de quantos mil dias marcaram a minha existência. Fui convidada a conhecer o restaurante La Piéce de Boeuf, na Ave. Corentin Cariou. Que almoço! Consumimos duas garrafas do delicioso vinho Sancerre.

Descansei um pouco e à noite já estava pronta para ir jantar no “Le Criole”, restaurante martiniquenho, onde servem uma bebida a base de rum e frutas tropicais. Dançamos ao som de salsas e merengues. Que noitada memorável!

Hoje passamos o dia fora de Paris e visitamos o museu de Gaugin. Retornamos bastante tarde. Como estamos na semana de carnaval, combinamos de ir aos Jardins do Louvre amanhã participar de um Baile Veneziano.

Danielle é uma amiga magnífica, inteligente e com gostos semelhantes aos meus, mas um pouco diferente do companheiro, homem sério, um intelectual, que leva a vida a revisar obras filosóficas. Digo que ela é minha alma gêmea. Fomos nós duas, ao baile nos jardins do Louvre. Compramos fantasias e máscaras. Ah! Que festa! Como nos divertimos! Foram tantos abraços de condes dráculas, dodges venezianos, reis e pintores reencarnados. Uma loucura. Falei do Carnaval do Brasil e convidei-a. Só assim poderia ver a diferença.

Paris neste ano está com a temperatura muitos graus abaixo de zero e quase não vemos pessoas nas ruas, mas o céu é de um azul estonteante. Em todo lugar aproveito para contar as minhas aventuras. Ontem fomos a Giverny e, apesar das névoas e do frio, tivemos um agradável dia nos jardins que inspiraram Monet e até hoje encantam tantos artistas.

Aproveitamos o fim de semana do carnaval e fomos à Veneza. No domingo participamos do famoso baile à fantasia da Piazza San Marco. Um espetáculo teatral, onde passado e presente se juntam ao som de melodiosas valsas e polcas. Apesar da noite gelada e de fortes ventos, nos aquecemos com um bom vinho e fomos dançar.

Danielle com o seu par. Eu caí nos braços de um mascarado, que poderia ser Dom Juan ou Casanova, mas sabia dançar muito bem. Estava fantasiada de dama da corte, não sei de que reinado e nem uma vez tirei a máscara, preferi ficar no anonimato.

Foi uma grande noite. Voltamos direto para Londres, por dois dias e conheci também Viena, esta sim, tocou o meu coração, com seus sóbrios e históricos palácios, museus, casas de chá, um verdadeiro encanto sentindo a nostalgia da velha cidade das valsas.

Ficamos num hotel antigo e charmoso, onde saboreei o melhor chá da minha vida. Não choveu. A neblina, cobria tudo. Mas valeu a pena. Visitamos palácios, museus e parques. Almoçamos numa encantadora estufa aquecida ao som de violinos, sempre acompanhada de um bom vinho.

À noite regressamos. Danielle partiu. O trabalho os esperava. Eu, com tudo o que a vida me dá de direito, permaneci por mais uma semana e agora, meu caro amigo, estou no aeroporto e me despeço desta cidade linda e aconchegante, mesmo debaixo de frio e neve. Sabes muito bem da minha idéia fixa de um dia vir morar neste país, aqui ou em qualquer outro recanto perdido, entre flores e pássaros. Abraços da amiga viajante e sonhadora. Paris, 27/02/86.

quinta-feira, 8 de setembro de 2011

Querido Amigo

“Querido amigo,

Estamos no mês junho. Paris, como sempre está magnífica, florida e com a temperatura entre quinze e vinte graus. É realmente, uma cidade refrigerada e o Paraíso, se existe, deve ser assim. Novamente, faço aquele velho roteiro sentimental pelas suas ruas e avenidas. Gosto de admirar os belos e sóbrios prédios, sua arquitetura e estilos.

Vim acompanhando um grupo de artistas plásticos para realizarem o sonho da vida inteira: Mostrar seus trabalhos nesta cidade, onde a arte é de todos e para todos. Para este projeto tive o aval do Senador Ney Maranhão que enviou uma carta de recomendação ao Jornalista Sebastião Nery, atuante Adido Cultural da Embaixada do Brasil. Infelizmente quando fui entregar-lhe a carta ele de nada sabia. Deixei uma senhora brasileira que prometeu reservar a Galeria e fazer os contatos com a Embaixada. Ela nada fez e foi aí que começou a minha “via crucis”. Finalmente conseguimos o local e tudo aconteceu.

O senhor Sebastião gentilmente se fez presente ao coquetel de abertura da Exposição com o assessor Antenor Borgeas e o representante da Unesco. Entre os convidados o Pintor Cícero dias, pernambucano e amigo de longas datas, acompanhado da esposa Raymonde, para enlevo dos artistas expositores, o Diplomata Marcel Morin e senhora, M. de Fortuit ex-Embaixador da França no Brasil e o vereador Alain Rivron que, diga-se de passagem, nos ajudou convidando pessoas ligadas ao mundo das artes. Assim, tivemos uma bela vernissage e um delicioso coquetel regado a champanhe.

Ontem, os artistas viajaram para Gênova onde vão participar da Exposição comemorativa do descobrimento das Américas. Resolvi permanecer aqui no Hotel Argentine, onde plantei o meu quartel general e só depois irei encontrá-los. Assim poderei respirar depois da tempestade.

Livre, leve e solta, com Paris só para mim, fui conhecer o belo Castelo de Chantilly, cercado de campos verdejantes e jardins. Cheguei cedo para aproveitar o silêncio e a beleza dos arredores. Passei um dia maravilhoso e, à noite, me ofereci um jantar à luz de velas, acompanhado do excelente vinho, “Romanée Conti”, não lembro a safra, mas sei que é um dos teus preferidos.

Toda essa extravagância, meu querido, para compensar os inúmeros aborrecimentos que, pela primeira vez, tive nesta cidade. Mal entendidos aconteceram e, devido à mediocridade de alguns dos artistas, sérios problemas foram criados e quase me transformam numa segunda Joana D´Arc.

Bem, a tempestade passou. Que maravilha! Aceitei o convite dos meus amigos e almocei com o simpático casal, os Morin, e nos deliciamos com ostras e champanhe.

Hoje fui convidada pelo meu amigo Embaixador M. De Fortuit para jantar no Ciel, charmoso Restaurante do Hotel Concorde Lafayette, de onde vemos Paris maravilhosamente iluminada. Bem podes imaginar a nossa farra gastronômica. Entre uma taça de champanhe e outra, eu me delicio e lembro de ti e do quanto gostas das minhas declarações de amor a esta bela e encantadora capital do mundo.

Deves, acredito considerar-me muito louca, enfrentar tempestades e ainda ousar pedir o néctar dos Deuses. Esta sou eu, tua amiga do coração que ama, e sempre está feliz em Paris. Abraços com saudades e muito afeto. Paris, 15 Junho de 1992. Ina Melo.”

domingo, 3 de julho de 2011







Querido amigo,

Hoje revisitei Paris assistindo a um belo filme do genial Woody Allen. Como sou de corpo e alma apaixonada por essa cidade, mergulhei na tela e me transportei através dele ao tempo passado, tão sonhado por mim: A Belle Époque.

Ah! Caro amigo, como somos saudosos do ontem! Parece que não foi só Proust que buscava o tempo perdido, todos nós vivemos à procura dele, seja em qualquer fase da vida. O filme, feito por um intelectual, profundo conhecedor da literatura e das artes, nos transporta para um mundo lírico, onde viver intensamente era o essencial para aqueles jovens sonhadores, ricos ou pobres, que iam à cidade luz, estudar todas as artes, até mesmo a do amor.

Nós assistentes e personagens, embalados pela música de Cole Porter pudemos vivenciar a vida parisiense na sua fase áurea, chamada sabiamente a Idade do Ouro. O gênio do cineasta, apresentando magistralmente os grandes nomes das artes e literatura tão nossos conhecidos, nos colocou dentro do filme.

Quem não vibrou com as inteligentes frases de Ernest Hemingway, Gertrude Stein, a irreverência de Picasso, as loucuras de Dali e tantos outros momentos de beleza e encanto. Caminhar em Paris debaixo da chuva! Amar, rir e por que não chorar! Quem não se lembra de “Cantando na Chuva”? Quem não caminhou um dia nas suas madrugadas frias e silenciosas?

E a loucura das festas milionárias embaladas pelo “Charleston”, onde todos dançavam, bebiam e amavam como se não houvesse amanhã. Para nós que amamos a literatura na sua essência e a arte, este filme nos proporcionou um magnífico passeio no tempo, mostrando com maestria o ontem e o hoje e as suas diferenças, numa lição onde o importante é a felicidade e a realização dos sonhos. Abraços com mil saudades. Recife/Junho/2011.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Cartas de Paris 2010

Meu querido amigo,

Pensei que nunca mais poria os pés neste encantador País. Os anos passam tão rápidos. Ou somos nós que passamos por eles?

Sentada num ensolarado dia num dos meus cafés preferidos, o Flore, faço o que mais gosto. Observo o mundo passar nos variados tipos de gente e sinto uma fantástica sensação: Ninguém me conhece! Assim, como se eu habitasse uma outra galáxia. E agora pergunto: e tu amigo de tantas confidências e lembranças, qual será a tua morada? As cartas que escrevo percorrem um caminho sem fim à tua procura e nunca recebo uma resposta. A última que recebi faz tanto tempo, que já esqueci o mês e o ano.

Lembro apenas que estavas numa pequena cidade da Provença e ao passar num campo de girassóis, lembrastes de mim enviando um belo cartão. Nele falavas de amor e paixão. Pela milionésima vez conquistavas uma nova mulher. És perito na arte da paixão e, assim, oferecias-lhe uma porção de sonhos o que sabes fazer muito bem.

Sendo tua velha amiga e confidente, ri ao ler as palavras de entusiasmo e a promessa: desta vez é para sempre. Apenas questionei: quanto durará a eternidade dessa paixão? Desejei e isto é a pura verdade, que a mosca azul do amor picasse forte o teu coração e dele nunca mais saísse. Aí me vens com esta triste história e, que tragédia! Estás realmente caído e tentas a todo custo uma reconquista, mesmo sabendo que não há reciprocidade.

Cuidado amigo pode te custar muito caro. Foi preciso deixar o tempo passar para ficares à mercê de uma mulher. É isso aí. Há um ditado que diz: “quem com muitas pedras mexem, uma lhe cai na cabeça”. Cuidado para não te “ferrares” como dizem os jovens do nosso tempo. O amor é o maior pregador de peças do mundo.

Assim, respondo ao teu cartão, desejando de coração que sejas muito amado e feliz. Paris, Junho de 2010.

domingo, 29 de maio de 2011

Cartas de Paris


Caríssima amiga The,



Hoje passados tantos anos e vivendo em mundos separados, assisto na TV às intempéries do inverno rigoroso que envolve essa cidade que tanto alimentou os nossos sonhos. Aproveito para te contar uma louca aventura que vivenciei e da qual, tenho certeza nunca te falei, talvez receosa da tua incredibilidade quando o assunto era “homem”.

Lembro muito bem que na época, estavas nadando num mar de felicidade, morando em Florença com o teu belo italiano, amor esse que permanece, apesar dos altos e baixos da vida. Bem, agora, de repente, todo um passado retorna e com ele as maravilhosas lembranças. O mês era novembro e não lembro mais o dia. Estava sentada no último Café, aquele perto do Arco do Triunfo, saboreando um “calvados”, quando dois penetrantes olhos negros derramaram sobre mim uma forte descarga elétrica. Encarei o desconhecido e ri para ele. Bem sabes que não tenho medo de nada e muito menos de homens. O calor invadiu o meu corpo e o coração parecia querer pular fora, mesmo debaixo da roupa. Logo estávamos conversando como se fôssemos velhos conhecidos. A chuva fina e o vento cortante insistiam em fustigar a cidade. Fui convidada pelo garboso italiano (só depois vim descobrir que era um árabe, falando fluentemente o idioma dos Césares) para um “drink” num lugar mais animado. Claro que aceitei.

Iniciamos a noite no bar do Ritz (minha paixão) e onde tantas e tantas vezes nós duas, pousando de milionárias ficávamos horas e horas com uma taça de champanhe, mas sempre sorridentes e encantadoras para não chatear o “barman”. O meu galante companheiro estava hospedado no Hotel e tinha à sua volta um bando de garçons sempre prontos para atendê-lo. Em seguida, convidou-me para acompanhá-lo no jantar. Antes de responder, olhei para mim e ele, sorrindo, concordou em me levar para trocar de roupa. Fez um sinal para um senhor grisalho e pediu que me acompanhasse ao Hotel Maurice, em Montparnasse. Fiquei com o coração aos pulos, pois previa uma noite de grande aventura.

O homem, cara amiga era eletrizante, lindo e parecia afortunado. Fui rápida e vesti um longo preto de corte divino, que deixava todas as formas do meu corpo bem acentuadas, apesar de nem um pedaço da pele a descoberto. Usei todos os colares de pérolas que possuía brincos e anéis Bem sabes como gosto delas. Estava pronta para me aventurar na noite parisiense. O cetim brilhoso realçava a cor platinada dos meus cabelos. Ao chegar sentir uma nova descarga elétrica pelo penetrante olhar do homem que me esperava. Ele usava um terno de "cashemere" preto, camisa de seda e um “foulard” cor de vinho. Mesmo montada em saltos altíssimos, quase que não alcançava o seu peito. Precisava levantar a cabeça para olhar bem dentro dos seus olhos. Saímos de mãos dadas e fomos para o “Colbert”s”. O lugar era requintado, mas sem ostentação. A mesa estava reservada e pelo arrodeio do Maître, vi que ele era realmente alguém importante Não me interessei. Sabia que iria ter uma noite maravilhosa. E assim aconteceu. Depois do jantar fomos dançar num "Club Privée", onde músicos russos tocavam violinos. Com a cabeça nas nuvens corpo e coração palpitantes, correspondi ao caloroso beijo que quase me deixou sem respirar. Acho que o sexo começou por aí. Fizemos amor até não sei a hora com direito a champanhe derramando-se sobre o meu corpo nu.

Assim, amiga realizei uma das minhas fantasias. Dormi com um árabe quente e carinhoso, numa suíte do meu hotel preferido em Paris. Espero que não te escandalizes. Podes pensar o que quiser, mas no outro dia depois de muitos beijos e abraços prometi que o esperaria para um novo encontro. Acontece, com o meu provincianismo, a primeira coisa que fiz, foi mudar de Hotel, indo para o outro lado da cidade. Nunca mais vi Amonhedad (que nome horrível). Às vezes penso que ele nunca existiu, mas só de lembrar, o meu corpo vibra da cabeça aos pés, mesmo passadas tantas décadas. Imagino a tua cara. A tua amiga hoje está invisível, talvez por conta do tempo e do policiamento a que nos submetemos quando ficamos com mais idade. Beijos e muitas saudades da nossa juventude. Recife, Fev/2010.