quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Amigo do Coração

Eis-me novamente em Paris, dessa vez para uma longa temporada realizando um sonho há muito desejado. O tempo passado alicerçando este projeto teve muitos mil dias, mas até que enfim aconteceu. Revisitando este mundo tão meu volto para reencontrar as várias mulheres que fui. Não sei qual delas eu gostaria de ser agora. É verdade que a essência é a mesma, a gente não muda, apenas nos acomodamos ao que a vida nos impõe. Escolhi uma pequena cidade banhada pelo Mediterrâneo para vivenciar esses dias de sonho sentir e abraçar o mar. Como sabes, ele e eu mantemos uma forte relação. É o único dos meus amores que possuiu o meu corpo e a minha alma por inteiro. Nunca questionei a sua fidelidade, não me importava. A ele eu me entregava sem nada pedir em troca. Quando me jogava nos seus braços queria desaparecer na sua infinitude. Ele, porém sempre me devolvia para as areias mornas da praia, deixando que a lua e as estrelas me cobrissem de luz. Muitas vezes travamos lutas violentas. Rancoroso, exercia a sua força fazendo de mim um nada, jogando-me sobre penhascos e redemoinhos e eu, qual sereia encantada, ria e zombava do seu poder. Às vezes passava tempos e tempos sem lhe dar a mínima atenção. Preferia seguir caminhos montanhosos e verdejantes aspirando o cheiro da terra, alimentando-me de frutos e flores. Outras vezes sentia falta dos seus abraços molhados, dos beijos lascívos sobre o meu corpo e era esse desejo do toque, que me levava de volta. Por isso amigo, estou aqui sentada neste penhasco, ouvindo o forte barulho do amante raivoso. Hoje não tenho mais força nem coragem para jogar-me de novo nos seus braços. O mais que posso fazer é deixar que ele venha beijar os meus velhos e cansados pés. Assim, retorno ao ontem, sentindo uma doce e quente saudade. Beijos molhados com cheiro de maresia.